O Cavador que Lia Livros No Tempo de Salazar – Francisco Cantanhede

 

Os homens e mulheres que ousavam ler livros e os que se atreviam a ouvir ler, mal tendo quase todos aprendido as primeiras letras, estavam, sem saber, conquistando impossíveis e construindo a utopia, pois é próprio das utopias procurar e ir procurando sempre, vendo mais longe e fazendo avançar o mundo, mesmo que se pressinta que a procura não vai ter fim.

É um modo de resistir, a recusa de baixar a cabeça, de encolher os ombros e de rastejar, sabendo que este não pode ser o destino de quem é gente.

Não aceitar, questionar, desobedecer a mandos injustos, está simbolizado neste livro de Francisco Cantanhede pela audácia de ler, ver mais do que os olhos alcançam, em tempo de obscuridade, hipocrisia e miséria, como foi o da ditadura de Salazar e Marcelo Caetano. [Aurora Rodrigues].

Quando nada havia para meter na panela de barro, anichada ao canto da chaminé debaixo da trempe de ferro, Maria, protegida pelo lusco-fusco, conseguia ludibriar a patrulha da G.N.R. que, a cavalo, se escondia junto das veredas por onde circulavam vultos de regresso a casa e, tateando com as duas mãos no chão, apanhar algumas boletas, alimentação reservada a porcos, proibida à boca de farrapos humanos. Cozinhava-as com folhas de funcho ou erva-doce para enganar a fome impiedosa que exigia ser contentada.

Se a ladra fosse apanhada, seguiria com o produto do roubo à cabeça, entre as duas bestas, até à sede do latifúndio. Na presença do dono daquilo tudo, provocada, humilhada, pediria mil perdões pelo crime cometido, juraria mil vezes não voltar a apanhar o fruto proibido a que só os suínos tinham direito. Maria deveria saber que a natureza criou a boleta para os porcos e os porcos nasceram para a boleta…

16,00

Informação adicional

Autor

Francisco Cantanhede

Ano de Edição

2022

Encadernação

Capa Mole

Idioma

Páginas

238

ISBN

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